176 ANOS FORMANDO MÚSICOS DE EXCELÊNCIA

Com vidas pregressas de abandono, os pets da EM fazem parte do dia a dia de estudantes e servidores

São três os pets adotados pelo corpo social da Escola de Música da UFRJ: Harmonia, uma gata; Melodia, um gato; e Gil, um cachorro. Com vidas pregressas de abandono, fome e maus tratos oriundos da crueldade de seres humanos, em caráter definitivo, em diferentes meses, passaram a fazer parte do dia a dia de estudos dos estudantes e de trabalhos dos servidores.

Harmonia fazia parte de uma bichanada, ocupante do terreno e sabe-se lá de qual cômodo do prédio que em tempos idos abrigava o extinto Automóvel Clube do Brasil. E, por assim ser, diferente de Melodia e Gil, o histórico conjunto arquitetônico formado pelo intitulado Prédio 1 e pelo Prédio de Aulas da Escola de Música não era para ela um lugar desconhecido.

  Nadeja Costa
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 Harmonia, Melodia e Gil.

Isso porque, sem ter quem dela cuidasse, não raro, em alguns dias era comum vê-la, junto com outros gatos, ultrapassar o muro que separa a Escola de Música do antigo prédio abandonado, agora em restauração, para ociosamente vaguear pelos espaços abertos do citado conjunto arquitetônico, assim como era habitual deixar de vê-la em outros dias.

Elizabeth Villela, a colega mais dedicada aos cuidados do gato residente no prédio 2 da EM, nos conta que Melodia, ainda filhotinho, numa noite de chuva, muito magrinho e faminto, ousou adentrar em um espaço até então para ele desconhecido, buscando abrigo e acolhimento. Também colaboram para os cuidados do Melodia: Neide Silva, Juliana Machado,  Ailton Batista de Andrade, Levi Graciano da Silva, Vera Conceição de Souza, Rodrigo Gomes de Deus, Antônio da Silva Chagas e, especialmente, o servidor agora aposentado Mário Lúcio Pierre.

E se, sem esforço algum, invadidos pelo sentimento da piedade e alívio, somos capazes de visualizar a cena da chegada de Melodia ao Prédio 2, sendo acolhido e cuidado por Neide Silva, Juliana Machado, Ailton Batista de Andrade, Levi Graciano da Silva, Vera Conceição de Souza e Rodrigo Gomes de Deus, não é sem repulsa que, na lembrança do resgate do Gil, constatamos que muitos de nós há muito se perderam da bondade, da brandura, da compaixão e do amor.

Com vários ferimentos pelo corpo do qual caíam vermes, esquálido, e famélico, vindo sabe-se lá de onde, na noite do dia 29 de janeiro desse ano de 2023, frente a uma das grades que guardam o Prédio da Reitoria, na Ilha do Fundão, ele se postou, pedindo com os olhos socorro aos guardas.

A assistência inicial e os primeiros cuidados foram dados pelo médico Carlos Alberto de Oliveira, habitual salvador e cuidador de vários dos animais perdidos pela Ilha do Fundão, pelo Diretor da Escola de Música, Ronal Silveira e sua esposa, Patrícia Mol. Os três fazem parte de um grupo de resgate e, tendo visto as fotos do pobre animal, foram à Ilha do Fundão à noite, deram os primeiros socorros e cuidaram com a colocação de uma coleira para que ele dali não se retirasse até a manhã seguinte, quando fosse resgatado. E assim foi que, na manhã do dia 30 de janeiro, conduzido pelo médico e outros voluntários do referido grupo, Gil chegou à Escola de Música, passando a ser vacinado, medicado, alimentado e cuidado. Gil ainda ganhou uma madrinha, a veterinária Juliana Macedo, que logo se prontificou a tratar clinicamente do cachorro sem nenhuma cobrança por seus serviços.

Em toda esta operação tão improvável para uma Escola de Música, foram fundamentais o apoio da Diretora Adjunta de Administração da Escola de Música, Fátima Tofano, e vários outros colaboradores ligados às empresas terceirizadas como os vigilantes Carlos Meireles de Oliveira, Rosaleide Miranda de Jesus, Fábio Ramos da Silva, Aline Rodrigues de Paula, Francisco Martins de Oliveira, Rogério da Silva Brito, Alex Gonçalves Ferreira, Alexandre da Silva Ribeiro (Shrek), José Claudio da Silva (Tandera) e Ricardo Antônio Soares, além dos brigadistas Aleksandra Lorayne de Menezes, Tiago de Araujo Pinto, Isaack Ramos e Dario Silva Adão, aos quais se somaram uma legião de docentes, discentes e técnicos.  

Não há quem possa dizer qual foi o dia exato, mas são muitas as pessoas entre servidores e estudantes que assistiram num dia qualquer Harmonia uma vez mais ultrapassar o muro, se aproximar, se deitar ao lado de Gil, nele se aconchegar e nunca mais deixar o prédio histórico, numa clara demonstração que, por Gil, a sua vida de abandono e perambulação sem sentido havia ficado no passado.

A data que todo corpo social da Escola passou a dividir com seu diretor as despesas relacionadas à compra de ração e dos medicamentos necessários a todos os pets também se perdeu de nossas memórias. O que de fato se fez presente e se tornou parte em nossas memórias são as cenas de carinho de todos para com Harmonia, Gil e Melodia que se repetem diuturnamente.

Concorrendo para demonstração das conclusões contidas na obra Cat Sense, de John Bradshawn, especialista em felinos, que, entre outras, registra que qualquer que tenha sido a experiência vivenciada anteriormente pelos gatos, mesmo quando já adultos, eles são capazes de se adaptarem às pessoas e ao ambiente que lhes propiciam uma vivência feliz, Elizabeth Villela nos relata outra vez que: “por ser amado pelas crianças que freqüentam as Atividades de Extensão da Escola de Música, Melodia adora uma brincadeira e um chamego. Ama música e não é incomum escolher uma sala onde está sendo dada uma aula de instrumento, seja ele qual for, do piano ao trompete. Deita em uma cadeira e por ali fica dormindo ao som das aulas. Sua mansidão faz dele um gato extremamente amoroso, se relacionando com muita ternura com toda comunidade do Prédio 2.

Nas assertivas desse mesmo especialista mencionado consta a de que, entre os hábitos dos gatos estão: brincar, arranhar, descansar em lugares altos, mostrar a barriga e monitorar seu território. Não contrariando tal afirmativa, Harmonia como outras e outros de sua espécie faz tudo isso. Mas não se pode deixar de assinalar que, em meio aos seus hábitos, existe um que dia após dia, mês após mês se destaca pela constância: o monitoramento dos salões, das salas de aulas e das salas destinadas ao trabalho administrativo.

Daí, em razão dessa fiscalização exercida nos referidos espaços que ela, seguramente, julga ser seu território, Harmonia acompanha aulas, ensaios, récitas e até mesas redondas ou eventos solenes, o que já causou cenas inusitadas que viralizaram pela internet. A presença da gatinha é tão frequente que algumas vezes é preciso prendê-la em alguma sala para que não prejudique, por exemplo, a récita de uma ópera ou apresentações das orquestras. Em algumas dessas oportunidades, ela aparece como se ali estivesse para verificar se tudo está transcorrendo como deveria. Em outras, tudo lhe parece interessar e, por isso, ela permanece no local até que tudo seja finalizado.

E, quando se trata de dizer a respeito do Gil, uma certeza se instala: em menos de doze meses, de uma ou outra forma, ele percebeu que no mundo não existem apenas pessoas cruéis. Existem outras diferentes daquelas ou daquela que o feriu fisicamente e o fizeram conhecer o medo. Confirma essa sentença o fato de ele agora permitir que, ao longo do dia e parte da noite, estudantes e servidores dele se aproximem, para com gestos de carinho lhe demonstrar amor e cuidados e até mesmo para com ele brincar.

Essa percepção proveniente de sua inteligência que é, segundo estudos científicos, similar à de uma criança, para além de fazer com que seja por ele estabelecida essa nova relação com as mulheres e homens, fez também com que o medo, anteriormente tão presente em seu dia a dia, fosse substituído pela incorporação de uma atividade não prevista: a de guardião da Escola de Música da UFRJ.

Razão de pessoas não pertencentes ao quadro social da Escola serem por ele advertidas por meio de seus fortes latidos, quando entram no estacionamento.Já acostumado à rotina da Escola de Música, enquanto há movimento no prédio histórico, Gil está sempre preso à uma guia que permite sua movimentação por mais de 50 metros, embora afastado do acesso do público, a menos que este queira uma aproximação.

Melodia, Harmonia e Gil são os três animais que receberam acolhida na Escola de Música, mas é muito importante destacar que há muitos servidores, alunos e especialmente voluntários que, mesmo não tendo ligação com a UFRJ, estão sempre dispostos a colaborar para o bem estar dos animais abandonados nos campi da universidade, como por exemplo,  os professores aposentados Osvaldo Luiz Silva e Maria Helena Silva, as servidoras Miriam Perrota, Eliane Correia e Lea Lopes, os estudantes de cursos de pós-graduação Larissa Viana e Cleyton Moreira, além de vários outros discentes da UFRJ que, sem receberem uma bolsa ou auxílio de custo, dedicam energia, tempo e recursos financeiros próprios para os cuidados com eles.

Junto a todo esses voluntários que fazem parte desse exército do bem, existem outros que com o apoio da Reitoria e do Prefeito da UFRJ, Marcos Benilson  Maldonado, têm buscado acordos e  soluções para solucionar tudo que envolve essa questão tão delicada de abandono e maus tratos de animais.

Em fase de implementação está uma ação humanitária encabeçada pela Prefeitura Universitária e apoio da Fundação Universitária José Bonifácio, assim como em breve haverá a assinatura de um acordo de cooperação entre a Fiocruz e a UFRJ, visando fortalecer o olhar e os cuidados com os pets. Entre as ações educativas que visam, inclusive, a saúde e o cuidado com o meio ambiente, estão outras de cunho mais firme e direto como combater os constantes abandonos através da monitoração de câmeras de vigilância para que os criminosos sejam julgados e punidos com o rigor da lei.

Da convivência com nossos pets a certeza de que gostamos muito deles. Desse gostar a contribuição para que nossos mais virtuosos sentimentos sejam potencializados. Mais humana é a universidade que cuida também de seus animais.

Correspondência

Escola de Música da UFRJ
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