Fundada em 1848, a Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro consolidou-se, ao longo de quase dois séculos, como referência nacional e internacional no ensino, na pesquisa e na produção artística. Sua trajetória acompanha e influencia a história da música no Brasil, preservando tradições e, ao mesmo tempo, abrindo espaço para novas linguagens e formas de expressão. É nesse espírito que, em 2025, a Escola celebra seus 177 anos com a segunda edição da série Caminhos Modernos, reafirmando seu compromisso com a reflexão crítica, a inovação estética e a formação artística de excelência.
Entre os dias 11 e 15 de agosto de 2025, a Escola realiza sua tradicional Semana de Aniversário, com concertos diários às 19h no Salão Leopoldo Miguez, sempre com entrada franca.
A primeira edição de Caminhos Modernos, realizada em 2011, dedicou-se à criação musical posterior a 1950, contemplando a vanguarda do pós-guerra e as diversas correntes estéticas que marcaram a segunda metade do século XX. Inspirada no contexto histórico do polêmico artigo “Morreu Schoenberg”, de Pierre Boulez, a série buscou proporcionar ao público a experiência de ouvir, cotejar e refletir sobre obras esteticamente diversas, sem se restringir a debates teóricos.
Em Caminhos Modernos II, a proposta se expande com um distanciamento histórico de setenta e cinco anos em relação ao recorte original e incorpora as transformações ocorridas no mundo nas últimas décadas. A programação presta homenagem a dois compositores centenários — Pierre Boulez (1925-2016) e Luciano Berio (1925-2003) —, resgata nomes ausentes na primeira edição e celebra os 90 anos de Arvo Pärt e Terry Riley, além dos 80 anos de John Rutter e da compositora brasileira Vânia Dantas Leite (1945-2018).
O evento reunirá grupos artísticos da própria Escola — Orquestra Sinfônica da UFRJ, Coral Brasil Ensemble, Grupo de Percussão da UFRJ, Grupo ContempoMúsica — além do Laboratório de Música e Tecnologia (LaMuT) para apresentar obras que transitam do neoclassicismo ao minimalismo, da música tonal às experimentações eletroacústicas, explorando interseções entre tradição e inovação. Entre os compositores representados, figuram Sofia Gubaidulina, Astor Piazzolla, Olivier Messiaen, Karlheinz Stockhausen, György Ligeti, Henryk Górecki, entre outros.
Mais do que uma celebração institucional, a Semana de Aniversário da EM/UFRJ reafirma o papel da Escola como espaço de produção artística, pesquisa, preservação e difusão do repertório musical contemporâneo. A iniciativa mantém viva a vocação da instituição para a formação de intérpretes, compositores e pesquisadores, promovendo o diálogo entre o legado histórico e as novas possibilidades criativas do nosso tempo.
Confira a seguir, a programação:
11 de agosto (segunda-feira)
O primeiro dia do evento marca também a abertura da exposição “Orquestra Sinfônica da UFRJ, 100 anos: Uma Trajetória de Música e Educação”. A mostra apresenta um panorama histórico da OSUFRJ, o mais antigo conjunto sinfônico em atividade no Rio de Janeiro, cuja trajetória se entrelaça com a história da música no Brasil e da própria Escola de Música.
O público poderá conhecer imagens raras, painéis informativos e trechos do livro Orquestra Sinfônica da UFRJ – 100 anos, de autoria do maestro André Cardoso. QR Codes distribuídos pelo percurso permitirão ouvir obras de compositores ligados à Escola de Música. A exposição conta ainda com um espaço instagramável e totens que homenageiam personalidades marcantes na história da instituição.
A abertura, às 18h30, será seguida por um concerto do grupo de cordas da OSUFRJ, que apresenta um programa que atravessa linguagens e épocas, do neoclassicismo às texturas tintinnabuli de Arvo Pärt, passando pela releitura de tradições históricas de Henryk Górecki e pela atmosfera poética de Voyage, de John Corigliano, com o solista Eduardo Monteiro (professor de flauta da EM/UFRJ). O programa ainda conta com o Concerto para clarone da irlandesa Geraldine Green, com Thiago Tavares (clarone) como solista, e Pelimannit, de Einojuhani Rautavaara, que homenageia o folclore e os músicos populares finlandeses.
12 de agosto (terça-feira)
O segundo dia da programação traz um mergulho nas múltiplas vertentes da criação musical pós-1950, explorando desde a expressividade tonal até a pesquisa rítmica e a religiosidade na música de concerto. O concerto abre com a dramaticidade da Chaconne para piano, de Sofia Gubaidulina, interpretada por Thalyson Rodrigues. Na sequência, o pianista se une a Luciano Magalhães em Inverno Porteño, de Astor Piazzolla, obra marcada por ritmos e cores portenhas. O percussionista Tiago Calderano apresenta a vigorosa Psappha, de Iannis Xenakis, e o organista Benedito Rosa interpreta Offrande et Alleluia do Livre du Saint Sacrément, de Olivier Messiaen, de caráter contemplativo.
A segunda parte da noite é dedicada à música coral, com o Coral Brasil Ensemble sob regência de Maria José Chevitarese, interpretando o jubiloso Jubilate Deo, de Benjamin Britten, e o moteto O clap your hands, de John Rutter. O encerramento apresenta os Chichester Psalms, de Leonard Bernstein, na versão para coro, órgão, harpa e percussão, com Mariana Honorato El-Hader (soprano), Eduardo Biato (órgão), Giovana Sanches (harpa) e Pedro Moita (percussão). A combinação de linguagens, tradições e formações instrumentais faz desta noite um encontro marcante entre espiritualidade, teatralidade e inovação musical.
13 de agosto (quarta-feira)
A terceira noite apresenta um percurso pela música de câmara da segunda metade do século XX, onde tradição, nacionalismo e vanguarda se entrelaçam. A abertura traz Ritmata, de Edino Krieger, interpretada por Fábio Adour (violão), seguida da Sonatina para fagote e piano, de José Siqueira, com Aloysio Fagerlande (fagote) e Ana Paula da Matta (piano). A pianista retorna para executar Tema e variações para piano, de Marlos Nobre, antes da entrada do Grupo de Percussão da UFRJ — sob direção de Pedro Sá e com Wesley Lucas (marimba solo), Pedro Henrique, João Vítor Godoy e Matheus Barros — na intensa Marimba Spiritual, de Minoru Miki.
A noite prossegue com peças para clarineta solo, a Fantasia op. 87, de Malcolm Arnold, e o Prelude, de Krzysztof Penderecki, interpretadas por Carlos Leandro Nascimento da Silva (clarineta). O programa se aproxima do desfecho com Treffpunkt, de Karlheinz Stockhausen, e encerra-se com o marco minimalista In C, de Terry Riley, apresentado pelo Grupo ContempoMúsica sob regência de Alexandre Schubert.
14 de agosto (quinta-feira)
No quarto dia do evento, a Orquestra Sinfônica da UFRJ retorna ao palco destacando a versatilidade da música de câmara, com obras que transitam entre lirismo, pesquisa tímbrica e citações históricas. O concerto inicia com o Trio para flauta, violino e piano, de Nino Rota, interpretado respectivamente por Eduardo Monteiro, Fernando Pereira e Flávio Augusto. Em seguida, o clarinete assume o protagonismo com a Fantasia Sulamérica, de Cláudio Santoro, com Márcio Costa (clarineta), e a Sonata para clarineta solo, de Edison Denisov, com Gabriel Peter (clarineta).
O programa inclui ainda Steep Steps, de Elliott Carter, interpretada por Thiago Tavares (clarone), e Alma Redemptoris Mater, de Peter Maxwell Davies, com Helder Teixeira (flauta), Juliana Bravim (oboé), Márcio Costa e Gabriel Peter (clarinetas), Gilieder Veríssimo (trompa) e Paulo Andrade (fagote). As Rheinische Kirmertänze, de Bernd Alois Zimmermann, e a suíte da ópera The Good Soldier Schweik, de Robert Kurka, encerram a noite com o conjunto de sopros e percussão da Orquestra Sinfônica da UFRJ, sob regência de Marcelo Jardim.
15 de agosto (sexta-feira)
O concerto de encerramento reúne nomes históricos da música eletroacústica internacional em comemoração aos 30 anos do Laboratório de Música e Tecnologia (LaMuT), que reafirma sua vocação para a pesquisa e a experimentação sonora.
A primeira obra, Piano Memory (1982), de Vânia Dantas Leite, explora a improvisação. A parte eletrônica da obra foi composta com base em desenhos-partitura do artista plástico Paulo Garcez. A partir da gravação desta improvisação, a compositora propõe uma obra mista onde um pianista deve improvisar junto aos sons pré-gravados seguindo a mesma partitura-desenho. A interpretação é de Maria José Di Cavalcanti (piano) e Rodrigo Cicchelli Velloso (difusão)
Na sequência, um dos pioneiros da música eletroacústica no Brasil, Reginaldo Carvalho dialoga com a poesia concreta em sua obra Caleidoscópio IV (1968), uma trilha sonora para um curta-metragem em três movimentos. Semáforos, foi pensado para a abertura do filme, onde a música sincronizava com diversos sinais luminosos em uma estrada de ferro. O segundo movimento, Cleta, usa um poema de Ivan Setta, onde a própria voz do poeta é editada de forma a explorar o ritmo das palavras bicicleta, cleta e concreta. Por último, Pontuações Luminosas tem um caráter pontilhístico inspirado no ritmo de confetes sobrevoando as ruas em época de carnaval. A difusão é de Cláudio Bezz.
Em Sirens (1958), a mezzo-soprano Cathy Berberian faz uma leitura interpretativa de um trecho do capítulo onze (Sereias) da obra Ulisses, de James Joyce. Esta mesma gravação foi utilizada como matéria-prima para Thema (Omaggio a Joyce) (1961), de Luciano Berio. O compositor joga com as implicações rítmicas e semânticas do material, colocando em primeiro plano as características musicais da língua falada. A difusão é de Orlando Scarpa Netto.
Artikulation (1958), de György Ligeti, busca criar uma linguagem artificial a partir de sons eletrônicos que recriam as articulações de perguntas e respostas, entonações graves e agudas, interrupções, mudanças de humor, explosões e sussurros.
Deux Études (1952), a primeira obra eletroacústica do compositor Pierre Boulez, explora a técnica de organização serial em sons gravados. Os timbres, durações e intensidades dos sons são organizados de forma serial, criando uma ponte interessante entre a música eletrônica alemã e a música concreta francesa.
Symphonie Magnétophonique (1958) apresenta uma sinfonia de sons cotidianos capturados em fita magnética. Else Marie Pade buscou representar a paisagem sonora de um dia completo na cidade de Copenhague, Dinamarca, com sons matinais de ronco, chaleira e despertadores seguidos por sons de um dia de trabalho e, por fim, noturnos.
Semana de Aniversário da Escola de Música da UFRJ 2025
📅 11 a 15 de agosto | 19h
🏛 Salão Leopoldo Miguez – Escola de Música da UFRJ
📍 Rua do Passeio, 98 – Centro, Rio de Janeiro/RJ
🎟 Entrada franca
