Mozart com sotaque brasileiro: Ópera na UFRJ leva “As Bodas de Fígaro” ao palco com protagonismo estudantil

A ópera As Bodas de Fígaro, de Wolfgang Amadeus Mozart, ganha uma nova leitura nas mãos de estudantes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Com récitas nos dias 26, 27, 28 e 29 de junho e 03 de julho, no Salão Leopoldo Miguez, e no dia 05 de julho, em Teresópolis, a montagem faz parte do Projeto Ópera na UFRJ, em parceria com a Orquestra Sinfônica da universidade.

Sob regência do maestro André Cardoso e direção cênica de José Henrique Moreira, o espetáculo destaca-se pelo envolvimento direto de alunos em todas as frentes — do palco à costura, da música ao cenário, da iluminação à captação de vídeo. “A ópera é um gênero grandioso e complexo: tem teatro, figurino, cenário, luz, orquestra, coro, gravação, transmissão ao vivo… Fazer isso numa universidade pública, com todos os seus limites estruturais e financeiros, é um desafio. Mas temos uma riqueza humana infinita”, afirma Lenine Santos, diretor geral da montagem.

Segundo ele, participar de uma produção dessa dimensão representa um marco na formação de estudantes de canto. “É um divisor de águas, mesmo para quem canta um papel menor ou está no coro. Amplia os horizontes culturais. Vários alunos que passaram pelo projeto estão hoje em teatros importantes, como o Municipal do Rio, ou seguiram carreira internacional em companhias e óperas-estúdio”, afirma.

Além da Escola de Música, o projeto envolve alunos da Escola de Belas Artes e outras unidades da UFRJ. Os figurinos e cenários são concebidos pelos próprios estudantes, sob orientação das professoras Andréa Renk e Desirée Bastos. “Todo o espetáculo é criado pelos alunos. Eles cortam tecido, costuram, fazem provas, desenham croquis, constroem elementos de cena. Muitos saem do projeto já com convites profissionais”, relata Lenine.

Escolhida por sua força dramática e versatilidade estética, As Bodas de Fígaro é uma das óperas mais encenadas no mundo. A montagem da UFRJ aposta numa abordagem com referências visuais brasileiras. “O público vai se reconhecer nela. O diretor José Henrique Moreira conseguiu dar uma brasilidade que o figurino e o cenário abraçaram com muita beleza. A música continua universal — e maravilhosa — mas ganha um novo sotaque”, conclui Lenine.

A entrevista completa com o professor Lenine Santos sobre a montagem de As Bodas de Fígaro está disponível no episódio de 20/06/25 do podcast Som do Passeio:

SERVIÇO

Ópera “As Bodas de Fígaro”, de W.A. Mozart
📍 Escola de Música da UFRJ
Salão Leopoldo Miguez — Rua do Passeio, 98 – Centro, Rio de Janeiro
🗓️ 26 e 27 de junho | 18h
🗓️ 28 e 29 de junho | 16h
🗓️ 03 julho | 18h (sessão extra)
✅ Entrada franca
🎟 Senhas distribuídas 30 minutos antes, na portaria da Escola de Música

📍 Teatro Feso Pro Arte – Teresópolis
🗓️ 5 de julho | 16h
✅ Entrada gratuita

Centenário da Orquestra Sinfônica da UFRJ lota Sala Cecília Meireles em concerto histórico

Em 25/09, a Sala Cecília Meireles foi palco de um concerto histórico: o centenário da Orquestra Sinfônica da UFRJ. Exatos 100 anos antes, em 25/09/1924, deu-se no Salão Leopoldo Miguez a primeira apresentação da então Orquestra do Instituto Nacional de Música (primeira encarnação da atual OSUFRJ).

“A ocasião era uma solenidade de entrega de prêmios a alunos laureados, na qual esteve presente, inclusive, o então presidente da República Arthur Bernardes. Dirigida pelo professor Ernesto Ronchini, a orquestra contou com 33 alunos, vários dos quais viriam depois a se destacar no cenário musical brasileiro, como o violoncelista Iberê Gomes Grosso, o violinista Oscar Borgerth, a violinista Mariuccia Iacovino e Yolanda Peixoto, a primeira spalla da Orquestra. Foram executados dois números de uma suíte do compositor Leopoldo Miguez, Cenas Pitorescas, e duas pequenas danças de autoria do próprio maestro Ronchini”, comenta o maestro André Cardoso, diretor artístico da OSUFRJ. Foi um concerto breve, mas fundamental.

Cem anos depois, ali perto, ocorreria aquele que pode ser descrito como um dos mais importantes concertos da história da Orquestra, sob a regência de três gerações de maestros que estiveram à sua frente: André Cardoso, Roberto Duarte (titular entre 1978 e 1995) e Ernani Aguiar (titular entre 1995 e 2023), todos merecidamente homenageados ao longo da noite, vale salientar.

A Sala Cecília Meireles lotada pode acompanhar uma impactante apresentação que incluiu o Episódio Sinfônico de Francisco Braga, o “principal regente da Orchestra do Instituto Nacional de Música”. A obra foi composta em 1898 e se tornou uma das mais executadas pela orquestra ao longo de suas cem temporadas.

Em seguida foi apresentado o Scherzo Sinfônico, de Raphael Baptista, um dos maestros responsáveis pela reformulação da orquestra em 1969 e nomeado seu regente titular em 1977. Outro destaque foi a emocionante ária Era un Tramonto d’oro, impecavelmente interpretada pelo barítono Inácio de Nonno, e que suscitou gritos de “bravo” entre os presentes. A peça relembra a gravação da ópera Colombo, de Carlos Gomes, que conquistou prêmios importantes no final dos anos 1990.

O público também pode apreciar Sugestões de Coral e Dança, de César Guerra-Peixe, e a estreia mundial do poema sinfônico O Pássaro Mágico, de Pedro Lutterbach, vencedor de um concurso de composição em homenagem ao centenário da UFRJ. A obra, inspirada em uma lenda indígena, narra a história de um tincoã que se transforma em homem e enfrenta desafios amorosos e tribais.

Os quinze minutos de pausa foram providenciais para que todos pudessem se recompor de tão belo e emocionante espetáculo, que chegava apenas em sua metade ainda.

Na segunda parte, a música se tornou mais popular, com Saudades de Pirapora, peça original de Everson Moraes, trombonista da Orquestra, que presenteou o público com uma deliciosa “história de pescador” acerca de um oficleide (raríssimo precursor do saxofone), encontrado por seu Nilton, o agora “pescador de oficleide”, nas margens do Rio São Francisco, em Pirapora (MG).

A história é tão insólita que vale o parêntese. Após décadas submerso, o instrumento chegou às mãos do músico da Orquestra, que descobriu que ele já havia passado pelo Rio de Janeiro há mais de 100 anos. O oficleide, muito utilizado por bandas e orquestras no passado, estava em péssimas condições, levando o luthier Marcelo Castro a realizar reparos por oito meses. Reza a lenda que ele inclusive decidiu se aposentar depois deste trabalho. Durante a restauração, foram encontradas marcas que indicavam sua origem no Rio, como a assinatura de um fabricante francês e um endereço de uma loja carioca. Everson escolheu tocar a famosa Carinhoso, de Pixinguinha, ao reintroduzir o instrumento após sua incrível jornada.

A festa seguiu com o tango Aí, Morcego, de Irineu de Almeida, peça que contou com participação especial de todos os presentes na plateia. Após um breve “ensaio”, ao sinal do maestro André Cardoso, toda a casa soltava a voz e repetia “Aí, Morcego!”, rendendo uma homenagem ao boêmio Norberto Amaral, o Amaral dos Correios, que, sob a alcunha de “Morcego”, ganhou fama de “o maior carnavalesco de todos os tempos” e acabou imortalizado naquela que pode ser considerada a principal obra de Irineu de Almeida.

Dois choros de Pixinguinha também foram apresentados. Ingênuo trouxe como solistas os professores Cristiano Alves (clarineta) e Júlio Merlino (saxofone). Na sequência, Um a Zero, que remete à vitória da seleção brasileira sobre o Uruguai no campeonato sul-americano de futebol de 1919, com gol do craque Friedenreich. Esta, segundo consta, teria sido a primeira obra da música nacional a abordar a temática futebolística.

O concerto também destacou a importância da música popular no contexto sinfônico, com a inclusão de um arranjo de A Voz do Morro, de Zé Ketti, para a abertura do filme “Rio, 40 Graus”. Este arranjo, recriado por Leonardo Bruno, é uma homenagem ao cineasta Nelson Pereira dos Santos. E, como nem tudo acaba em samba, para encerrar a apresentação, o público foi brindado com a Dança de Chico Rei e da Rainha N’Ginga, do balé “Maracatu de Chico Rei”, de Francisco Mignone, uma verdadeira obra-prima da música sinfônica brasileira.

Sob o som dos efusivos aplausos, ainda pode-se ouvir um merecido “Parabéns pra você” ao som da agora centenária Orquestra, encerrando com alegria uma noite de festa que certamente ficará marcada na memória de todos os presentes. Afinal, não é todo dia que se faz cem anos!

Em 02/09, Orquestra Sinfônica da UFRJ faz concerto de sua 100ª temporada com obras brasileiras e estreia de Ernani Aguiar

Em 02 de setembro, às 19 horas, a Orquestra Sinfônica da UFRJ retorna ao palco do Salão Leopoldo Miguez, da Escola de Música da UFRJ, para mais um concerto da sua centésima temporada. Desta vez, a apresentação contará exclusivamente com obras de compositores brasileiros. A regência será do vice-diretor da EM/UFRJ, o maestro Marcelo Jardim.

O “Batuque” da Suíte Reisado do Pastoreio, de Lorenzo Fernandez, abre o programa com especial significado por representar as mais de 200 obras executadas pela orquestra em estreia mundial ao longo de sua trajetória artística. A obra teve sua estreia exatamente no palco do Salão Leopoldo Miguez em 29 de agosto de 1930. Mais relevante se torna a execução por ter o “Batuque” se consagrado como uma das obras orquestrais mais conhecidas e executadas de compositor brasileiro, tanto no país quanto no exterior.

A estreia da noite é a Sinfonia “Serrana”, de Ernani Aguiar, obra com textos de poetas nascidos em Petrópolis e que traz para o concerto a participação do Coro Sinfônico da UFRJ, grupo formado pela junção de todas as turmas de Canto Coral da Escola de Música, sob a responsabilidade das professoras Maria José Chevitarese (Brasil Ensemble), Valéria Matos (Sacra Vox), Juliana Melleiro Rheinboldt e do professor André Protásio (classes de Canto Coral), abrilhantados pela participação especial do professor e barítono Marcelo Coutinho como solista.

O programa finaliza com uma obra emblemática de Villa-Lobos, um ex-aluno da Escola de Música que se consagrou internacionalmente como um dos grandes compositores do século XX. O Choros no10 apresenta uma espécie de quadro sonoro da natureza e da cultura brasileira, amalgamando, de certa forma, os ambientes rurais e urbanos. Na primeira parte se ouve uma “variedade de pássaros que existem em todo o Brasil, sobretudo os que vivem nos bosques e florestas e os que cantam à madrugada e ao entardecer nos infinitos sertões do Nordeste”. Na segunda parte, melodias “à maneira dos cânticos de rede que os índios Parecis entoam” se juntam aos vocalizes do coro “sem nenhum sentido literário”, mas “apenas servindo de efeitos onomatopaicos, para formar ambiente fonético característico da linguagem dos aborígenes”. O elemento urbano é a melodia da schottish “Yara”, de Anacleto de Medeiros, outro ex-aluno da Escola de Música, reconhecido como um dos mais importantes nomes na consolidação do choro como forma musical instrumental típica do Rio de Janeiro no início do século XX. Um elemento a mais é a letra incorporada pelo poeta seresteiro Catulo da Paixão Cearense, cuja passagem pelo Instituto Nacional de Música, a convite de Alberto Nepomuceno, o fez merecedor de uma placa em sua homenagem.

A entrada é gratuita e a apresentação está marcada para as 19h, no Salão Leopoldo Miguez, da Escola de Música da UFRJ, que fica na Rua do Passeio, 98, próximo à estação Cinelândia do metrô.

 

PROGRAMA

1. Oscar LORENZO FERNANDEZ (1897-1948) – Batuque da Suíte Reisado do Pastoreio (1930) 4’

2. Ernani AGUIAR (1950) – Sinfonia “Serrana” (2024) 20’ estreia

I- “Ária do Forte” (Allegro) – Texto de Reynaldo Chaves
II- “Antúrios” (Lento) – Texto de Wolney Aguiar
III- “Noturno” (Andante calmo) – Texto de Raul de Leoni
IV- “Aquela Serra” (Allegro molto) – Texto de Hélio Chaves

3. Heitor VILLA-LOBOS (1887-1959) – Choros no10 “Rasga Coração” (1926) 13’
Texto de Catulo da Paixão Cearense

Marcelo Coutinho (barítono)
Coro Sinfônico da UFRJ
(Classes dos professores Maria José Chevitarese, Valéria Matos, Juliana Melleiro Rheinboldt e André Protásio)
Orquestra Sinfônica da UFRJ
Regência de Marcelo Jardim