Concertos UFRJ: Barroco italiano

Concertos UFRJ desta semana destacam o barroco, que, na historia da música, costuma ser delimitado entre os anos 1600 e 1750.  Período que vai do nascimento da ópera e das primeiras obras-primas do gênero, com Monteverdi, até a morte de J. S. Bach. Um século e meio em que, segundo os estudos contemporâneos, predominou mais a continuidade reelaborada dos padrões estéticos anteriores do que propriamente a ruptura com eles. Os mesmos modelos da Antiguidade Clássica, interpretados agora de forma diversa.

 

Afinal, havia algo de precário no pensamento renascentista. O equilíbrio, a simetria e a contenção que seus intelectuais e artistas propugnavam não era um produto da época, mas um ideal sobreposto (e imposto) a ela. Não poderia sobreviver aos impactos de um mundo cada vez mais desigual e em franco processo de transformação. Deveria, como aconteceu, ceder lugar a uma arte mais consentânea, baseada em contrastes e na valorização do excesso.

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Ouça aqui o programa: 

Toda segunda-feira, às 22h, tem "Concertos UFRJ" na Roquette Pinto FM. Sintonize 94,1 ou acompanhe pela internet!

Programas anteriores podem ser encontrados na seção Concertos UFRJ.
   

No século em meio da vigência do estilo, o regime estamental, forjado no final da Idade Média, permanecerá como paradigma social, ainda que domine a sociedade urbana e o crescimento da economia mercantilista, baseada no comércio, fortaleça uma burguesia cada vez mais ambiciosa.  Legitimadas por direito divino, as monarquias absolutistas dominarão a cena política, enquanto a cultura artística ficará marcada pelas tensões entre o espírito da reforma e da contrarreforma.

 

Do ponto de vista do seu lugar na ordem social, os criadores culturais continuarão dependendo do sistema tradicional de mecenato: a igreja, os reis, a nobreza e alguns burgueses refinados serão os principais promotores das obras musicais e artísticas. Mas os criadores culturais - os músicos em especial - vão aos poucos abrindo mão da generalidade renascentista e se tornando, para o bem e para o mal, especialistas.

 

O barroco nasceu na Itália, país que desde a Renascença havia se tornado polo de atração de inúmeros artistas e referência para as demais nações do continente. Se os modelos estéticos continuam os mesmos, as formas puras, uniformes, equilibradas e idealizadas do período anterior dão lugar a emoção, a exuberância, a grandiosidade e a opulência. O artista se vê livre para experimentar novas formas e em sua vontade de expressão recorre aos efeitos teatrais, à distorção e à assimetria das formas e da ornamentação.

 

Apesar da origem peninsular, o barroco é heterogêneo e a ausência de uniformidade se manifesta na formação de estilos nacionais, locais e mesmo individuais, uma diversidade que torna extremamente complexas definições para a música e as artes em geral no período.

 

Seus principais representantes do barroco italiano, que ganhou características católicas, se opondo à Reforma que se formara na Alemanha, foram o pintor Caravaggio, o escultor Bernini, o arquiteto Borromini e, na música, Vivaldi. O programa mostra um pouco desta rica diversidade elegendo obras de seis compositores do período.

 

Reprodução
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Acima, Corelli e Francesco Geminiani. Abaixo, Albinoni e Francesco Manfredini.

Arcangelo Corelli


Arcangelo Corelli (1653–1713) foi mais conhecido à época como um grande virtuose do violino, instrumento que, segundo o maestro Nicolaus Harnoncourt, encarna como nenhum outro o espírito do barroco. Embora sua produção integral resuma-se a seis antologias, sua escrita instrumental é admirada pelo refinamento harmônico e estilo brilhante, tendo sido referência para outros compositores, entre eles Johann Sebastian Bach e Georg Friedrich Haendel.

 

Pouco se sabe acerca da vida de Corelli, a não ser que a maior parte de sua carreira transcorreu em Roma, onde foi patrocinado por aristocratas e nobres. Como virtuose, contribuiu para consolidar novas técnicas de interpretação e, como professor, teve entre seus alunos Francesco Geminiani e Antonio Vivaldi. Como compositor, é conhecido, sobretudo, por seus doze concerti grossi, que representaram então uma nova forma de composição.

 

Francesco Geminiani


Francesco Geminiani (1687-1762) foi um compositor, maestro, violinista virtuose, além de importante teórico da música. Aluno de Alessandro Scarlatti, Carlo Ambrogio Lonati e Arcangelo Corelli, assumiu em 1711 o cargo de maestro em Nápoles. Em 1714, quando em Londres para uma série de concertos como violinista, acabou chamando a atenção do conde de Essex e fixando residência na cidade, trabalhando, além de intérprete, como compositor e professor. Na sua produção se destacam as sonatas para violino e baixo contínuo e os sete concerti grossi, em que introduziu a viola como parte do concertino.

 

Albinoni

 

Tomaso Albinoni (1671-1751) nasceu na República de Veneza. Famoso em sua época como compositor de óperas, atualmente é mais admirado por sua música instrumental. Graças a seu talento melódico e estilo pessoal foi tão popular na quanto Corelli e Vivaldi.

 

Albinoni foi um dos primeiros compositores a escrever concertos para violino solo. Sua música instrumental atraiu a atenção de Johann Sebastian Bach, que escreveu pelo menos duas fugas sobre temas de Albinoni e constantemente usava seus baixos como exercícios de harmonia. Grande parte do trabalho de Albinoni perdeu-se, porém, durante o bombardeio de Dresden, durante a Segunda Guerra Mundal. Sabe-se, porém, que compôs cerca de oitenta óperas, das quais não resta quase nada, além de trinta cantatas, das quais só uma sobreviveu. O que nos chegou foi sua produção instrumental, que havia sido publicada, e na qual se destacam os seus concertos para oboé, outro instrumento muito valorizado no período.

 

Giacomo Facco

 

Giacomo Facco (1676-1753), outro violinista e, ao mesmo tempo compositor, teve sua obra redescoberta pelo musicólogo italiano Uberto Zanolli, em 1962. Publicou em Amsterdã uma série de 12 concertos para violino, cordas e órgão em dois volumes (1716-1719), antes de partir para Espanha, país em que faleceu e onde ocupou importantes cargos, muitos dos quais acabou perdendo devido a intrigas de concorrentes. Compôs, então, além de numerosas obras sacras para a Capela Real de Madrid, provavelmente perdidas com o incêndio de 1734, óperas, um melodrama em estilo italiano e, pelo menos, uma zarzuela.

 

Francesco Manfredini

 

Francesco Manfredini (1680-1762) foi discípulo de Giuseppe Torelli, famoso compositor e violinista italiano e figura de destaque no desenvolvimento do concerto grosso. Muito do que Manfredini compôs acabou perdido, apenas 43 trabalhos publicados e um punhado de manuscritos são conhecidos. Os de maior destaque são o seu Concerto de Natal, Op. 3, e sua coleção de seis sonatas, editada em Londres em 1764.

 

Antonio Vivaldi

 

O padre Antonio Lucio Vivaldi (1678-1741) é, sem dúvida, o mais importante compositor do barroco italiano.

 

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VeneziaCalledellaPietaLapideVivaldi400
Acima, somente uma placa posta em 1978 lembra a presença e morte de Vivaldi em Viena. Abaixo, placa em memória do compositor ao lado da igreja e academia da Pietà, em Veneza, onde Vivaldi foi maestro por muitos anos (1703-1740).

Conhecido como “il prete rosso” (“o padre ruivo”) por seus cabelos ruivos,  compôs quase 800 obras, entre as quais cerca de 500 concertos e mais de 40 óperas. É, porém, apreciado pelo público de hoje por sua série de concertos para violino e orquestra intitulada “Le quattro stagioni” (“As Quatro Estações”).

 

A música de Vivaldi é particularmente inovadora, rompendo com a tradição consolidada em esquemas e dando brilho à estrutura formal e rítmica do concerto, através da procura de contrastes harmônicos, da invenção de melodias e trechos originais. Ademais, Vivaldi era francamente capaz de compor música não acadêmica, apara ser apreciada por um público amplo.

 

Entretanto, tal como muitos outros músicos da época, terminou sua vida na pobreza, pois sua obra não agradava mais aos gostos das novas gerações. Como resultado, ficou praticamente esquecido até o início do século passado, quando foi redescoberto devido, sobretudo, aos de Alfredo Casella, que em 1939 organizou a agora histórica Semana Vivaldi.

 

Desde então, as obras do compositor obtiveram sucesso universal e, com o advento da “interpretação historicamente informada”, foram catapultadas novamente ao estrelato.

 

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Parceria da Escola de Música (EM) com a rádio Roquette Pinto, a série Concertos UFRJ conta com a produção e apresentação de André Cardoso, docente da EM, e vai ao ar toda segunda-feira, às 22h, na sintonia 94,1 FM. As edições do programa podem ser acompanhadas on line ou por meio do podcast, audio sob demanda, da rádio Roquette Pinto. Contatos através do endereço eletrônico: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..

 

Repertório da Edição


• Arcangelo Corelli, Concerto Grosso op. 6 no 1 em Ré Maior. Academia de Saint Martin in the Fields com direção de Neville Marriner.
• Francesco Geminiani, Concerto Grosso em ré menor op. 2 no 3. Conjunto Tafelmusik e a direção de Jeanne Lamon
• Tomaso Albinoni, Concerto op. 9 no 6 em Sol maior para dois oboés, cordas e contínuo. Solistas Heinz Holiger e Maurice Bourgue como o conjunto I Musici.
• Giacomo Facco, Concerto a Cinco op. 1 no 11 em Sol Maior. Ensemble Albalonga e direção de Anibale Cetrangolo.
• Francesco Manfredini, Concerto Grosso op. 3 no 12 em Dó maior. Conjunto I Musici com Pina Carmirelli e Pasquale Pellegrino nos violinos concertinos e Francesco Strano no violoncelo concertino.
• Antônio Vivaldi, Concerto em Ré Menor RV 565. Concerto Koln.